{ 1 } Saber limpar sua mente e emoções é a maior virtude de um cérebro confuso.
Uma das principais razões para não escrever é “não estar com a cabeça pra isso hoje”. Há coisas capazes de limpar a mente de qualquer emoção ou pensamento fixado nela, colocando-a num estado de vazio no qual se consegue inserir qualquer desejo ou emoção – como o estado mental necessário para trabalhar seu texto.
Para a limpeza, comigo funciona ouvir meia hora de um disco do Mark Hollis /Talk Talk (na fase Post-Rock) ou synthpops instrumentais (Kraftwerk, Gary Numan). Eu particularmente tenho grande sensibilidade musical, e aprendi que canções de alta complexidade instrumental são capazes de tirar a mente do eixo, tornando-a maleável. Procure sua própria forma de lavar e destravar a sua.
{ 2 } Escreva com o que estiver na geladeira.
Você tinha planejado continuar seu conto de suspense, mas a tarde divertida e cheia de piadas com os amigos não lhe sai da cabeça, e sua mente não entra na atmosfera de suspense. Não acho necessário trabalhar um texto se você estiver realmente zerado de ideias e emoções em relação a ele, mas isso não significa que você pode largar a escrita por hoje e ir jogar videogame.
Escreva sobre qualquer outra coisa então, que esteja mais ligada ao humor ou à alegria. Saiba o que tem no cardápio da sua mente para o dia e cozinhe o prato com os ingredientes que tiver, sem culpa. Trabalhe com o que tiver na geladeira do seu cérebro, sem deixar para depois das próximas compras do mês, quando “tiver mais ideias”. Sua escrita fluirá em quantidade absurda; será divertido escrever.
{ 3 } Não se obrigue a ter um tema específico em tudo o que faz.
Ao criar um blog, não enfie na cabeça que nele você só escreverá contos, poesias e crônicas, ou que só escreverá coisas relacionadas a Ficção Científica ou Steampunk, a menos que você seja realmente obcecado pelos gêneros/temas escolhidos e tenha a certeza de que seu cérebro só produz coisas sobre aquilo. Sua mente não tem um tema fixo, pois reflete todas as suas mudanças de ideia e de humor.
Você não tem um tema fixo, e se obrigar a só escrever um tipo de coisa intimidará sua criatividade, que passará a descartar automaticamente ideias fora dessa área. Escritor é aquele capaz de transfigurar qualquer evento dentro do tempo-espaço em palavra. Não tenha medo de experimentar. Se hoje você se sente capaz de escrever sobre gatos, por que se limitar a escrever sobre cachorros?
{ 4 } Respeite o Princípio do Prazer.
Jamais escreva nada que não queira, ou da forma que não queira. Conforme mencionei na dica acima, a vontade da sua mente (quando controlada por você) dita seu trabalho. Se tentar fazer algo de má vontade ou porque acha que deve, cuspirá algo forçado. Tentei escrever dramaturgia durante meses, mas nunca entendi qual era a fórmula que o teatro pedia para os textos. Criei coisas medíocres, perdida no gênero. Frustradíssima, joguei tudo para o alto e fiz um texto de um jeito qualquer, que inventei na hora segundo minha vontade.
Achei o resultado uma bagunça, porém me agradou. Quando meu texto foi lido, todos os presentes ficaram surpresos com a originalidade do mesmo; era dramaturgicamente consistente e diferente de tudo o que já haviam visto. Considerado um de meus melhores textos até hoje. Eu havia descoberto a fórmula para fazer qualquer coisa bem feita: Fazer do seu jeito. Esqueça obrigações vindas de fora de você. Seu único compromisso é com você mesmo e seus desejos.
{ 5 } Escrever profissionalmente é um trabalho, no qual se deve bater cartão.
Escrita não é algo que cai do céu, que só deve ser feito para descrever algo magnífico e inspirador. Já mencionei que escritor é aquele que transfigura qualquer coisa no tempo-espaço em palavra; qualquer coisa. Escritor é um bicho privilegiado: O material de trabalho está à nossa volta; oxigênio, prédios, moscas. O local do trabalho é qualquer local onde estejamos. Quer mais o quê? Inspiração é algo que se cria, cada um tem sua fórmula mágica para causá-la.
Dei inúmeros exemplos acima de como atrai-la, fazendo o que sua mente deseja, limpando-a frequentemente, etc. Escreva todos os dias. Escreva qualquer coisa. Se não puder mesmo escrever, leia; seja seus textos antigos ou outros livros. Porém tenha em mente que todos os dias há trabalho a ser feito. Tenha compromisso com seu patrão, e ele é você. Se não for capaz de ter compromisso com a escrita, significa que você não está interessado no emprego que seu patrão oferece, isto é, não está interessado em seu próprio sonho. Peça demissão e arrume outra ocupação. Simples.
{ 6 } Se ficou bloqueado, anote todas as razões possíveis do bloqueio e estude-as.
Com a análise detalhada do problema, você pegará a raiz dele e poderá se concentrar em resolvê-la, ao invés de esperar a inspiração para a resolução dele vir do nada. Me livrei de bloqueios pesadíssimos em um ou dois dias com isso. Se for difícil descobrir, anote tudo o que souber sobre cada aspecto da história (motivos e ações de cada personagem, storyboard, espaço, tempo, etc). Quando a informação contida em cada tópico não fizer sentido sozinha, independente dos outros, há um erro ali.
{ 7 } Não se pode amar um personagem ou uma obra.
Fique fascinado por eles, tenha curiosidade de descobri-los, mas não se apaixone; pois quem ama protege, e um escritor não deve proteger suas criações. Você fará de tudo para que aquele personagem ganhe destaque, e acabará tendo desejos tolos como inserir uma cena dele brincando com um gatinho, porque “vai tocar o leitor ver o carinho dele pelos animais”.
Personagens não são filhos, são meros companheiros de viagem; você caminha com eles, os observa, faz anotações. Depois solta no mundo pra sofrer. Textos não são intocáveis; pedem mudanças radicais pelo próprio bem deles. Jamais os trate como filhos. Tenha apego profissional ao seu trabalho, e logo aprenderá a forma correta de amá-los – sem grude, ciúme, e aquela pieguice toda de primeiro mês de namoro.
Ananda Santos nasceu na capital paulista, em 1993. Escritora em formação, tem em seus princípios de vida a música dos anos 80 (Synthpop e New Wave) e a literatura. Nascida na Ficção Fantástica e recém-aventurada na Ficção Científica, usa de sua obsessão pela psicanálise e ceticismo como motores literários. Suas inspirações vêm da música e de análises comportamentais, seus principais passatempos. Como obcecada musical, suas preferências de artistas são Gary Numan, John Foxx, Depeche Mode, Talk Talk e Red Flag; como nerd gosta de mangás e animes como Bucky, D.Gray-Man e Fullmetal Alchemist.
Na literatura, suas paixões são Oscar Wilde (com o qual criou afeição pelo estetismo e dandismo, não apenas na literatura mas como estilo de vida), Conan Doyle, Philip K. Dick, Robert Louis Stevenson e Álvares de Azevedo. Você pode conhecer o trabalho de Ananda e entrar em contato com ela via seu blog, I Want to Be a Machine.
Contribuição originalmente publicada no site Vida de Escritor